quinta-feira, 3 de junho de 2010

Infinito Eu

Todo o mundo torna-se silencioso para que o som que ecoa infinitamente possa alcançar o mais longínquo poro do meu corpo. Um som... Se é interno ou externo eu não sei. Talvez tenha se misturado tanto, se fixado tanto em minha alma que já não é possível distinguir se é latente ou se é fator externo, forte é, no entanto, para me fazer duvidar e hesitar sem fazer separação. Por que o mundo silenciou também? Gostaria de saber do por que todas as coisas se aquietaram de sua tão costumeira agitação. Uma resposta chega-me ao ouvido. Uma voz tão poderosa que perco minhas forças e já não consigo andar. O sangue nas minhas veias perde o curso e confuso também pára, talvez ele próprio também esteja a espera... E olho por sobre os ombros e olho à minha frente e uma expressão de espasmo perpassa pelos meus olhos, rendida apenas ouço.
Tudo é tão quieto.
O som continua. O vento abraça-me levando-me a ficar ainda mais muda. Completamente silenciosa.
O silêncio e o vento. O som continua inebriando-me a tal ponto que sinto entender todas as motivações do mundo. Todos os mecanismos. Todos os atos de bondades e abandono. A lucidez me saúda e reconheço-a, para o meu espanto. Simplesmente entendo as coisas. Sua ausência e minha angustia. Silencio sóbria. Calo-me mais profundamente do que o mais profundo silêncio, numa maturidade antiga que se revela dentro de mim como se me pertencesse muito antes de eu nascer... Envelhecendo cem anos sinto-me fora de órbita.
Meus passos seguem fracos. Entendo a minha posição continuamente solitária. Eu até rio. Aceito. A respiração pesada causa-me aflição. Deixo-me sentir. Deixo o vento me acariciar e quero poder cair em sua proteção, vento. Quero deixar minhas pernas fraquejarem, já que estão terrivelmente fracas, e cair e ser amparada por ti, vento. Eu sigo e o som permanece ressoando e ecoando sem fim, dançando ao meu redor, vendo-me como não me vejo, olhando-me como sempre quis ser olhada. Eu fecho os meus olhos e quase sorrio. Um prazer percorre o meu corpo e sinto-me conectada com todo o mundo. Os meus olhos se abrem e tudo está quieto, mas o som me olha e me vê e deixo-me ser vista, sem nenhuma resistência, sem lutar, aliviada por ter sido encontrada e compreendida. O som que me encontrou e me abrigou me abraça, sinto suas mãos em meus cabelos e dedos em minha nuca e a respiração continua enfraquecendo e o coração descompassado entra no compasso da melodia, deixando-me exausta e extasiada, fora de mim, partindo-me em milhares de cacos. O som, ao torno de mim, gira, espantando o mundo e levando-me para o meu eu abandonado e desconhecido... Me acolhe, me acalenta, silenciando os meus medos enquanto descanso nos seus braços de Aceitação. Os meus passos querem parar e eu paro. E todo o mundo está tão quieto e eu fecho os meus olhos e até meus órgãos decidem silenciar, parando. Já não sou e nem há o que ser. Sumo. As imagens que permanecem insistentemente em minha mente vão esvaindo-se como névoa e eu me perco e o som continua levando-me pela mão pelos labirintos do meu eu e suas imagens passam por mim lentamente e eu estendo os meus braços para tentar Te alcançar e tu te esvais, como fumaça. Minha mão direita permanece sendo puxada pelo som e eu sigo obediente vendo teu rosto desmanchar por onde passo e vou seguindo e seguindo até alcançar a totalidade do silêncio, onde meu eu fragilizado e nu, segue fortalecendo-se pelo som infinito que me leva e eu vou seguindo, me esvaziando e seguindo, seguindo. Já não vejo imagens sua nas molduras da minha mente e agora o infinito espaço do meu eu está vazio e silencioso. Eu sinto uma água fresca nos meus pés e é tão infinito e eu amadureço e emudeço e vou me deixando levar e sendo levada e agora eu quero e preciso continuar com isso para me afastar. Para encontrar nessa maturidade força o suficiente para ser auto-suficiente e seguir, seguir, seguir, sempre só. Sempre só. Na sombra de tuas melodias, Vozes. A sua ausência me enfraquece, mas o som me leva e eu olho para trás e nada vejo, nem a sombra da fumaça das tuas lindas imagens, amor.

2 comentários:

  1. Esse lirismo extremo...
    é isso que eu te invejo.
    Esse mergulho reflexivo, esses achados poéticos: essas imagens, essas metáforas...
    tudo isso em virtude da autoreflexão...
    é um negócio que liberta, entende?
    eu não consigo essa liberdade de jeito nenhum,
    não consigo mesmo, eu penso demais pra escrever, tento demais ser impessoal.
    eu devo perder muita coisa com isso.

    você realmente tem uma escrita invejável.
    gosto muito... muito mesmo

    ResponderExcluir
  2. quem me dera ser um peixe como você, mas acabo sendo apenas um aquário, que gosta de ter por perto peixes como você que me fazem sentir viva, no mais profundo que essa palavra possa ser interpretada...
    a cada linha sua um suspiro meu, palavra nenhum transcreverá o que me passa ao te ler...
    mas me toca, me faz viajar, me deixar ver que o exato as vezes se torna sem graça...

    como pode alguém conseguir passar adiante com palavras o que vem na cabeça...eu apenas sei me calar e pensar...

    MARAVILHOSA...

    ResponderExcluir